RELIGIÃO E SOCIEDADE Entre o Sagrado e o Espetáculo: a transformação de templos evangélicos em palcos de performances e comércio da fé
Postado 18/11/2025 05H08
Religião - Por nossa equipe de reportagem
Nas últimas décadas, o crescimento das igrejas evangélicas no Brasil tem chamado atenção não apenas pela expansão numérica, mas pelas mudanças profundas em sua forma de atuar. Para muitos fiéis mais antigos, a essência da fé está sendo gradualmente substituída por práticas que lembram mais o entretenimento e o comércio religioso do que o que chamam de evangelho simples.
No município de Vila Velha, a situação não tem sido diferente. A presença marcante de templos de uma determinada denominação, cujo nome será preservado para evitar exposição indevida e manter o foco no fenômeno, e não em instituições específicas, revela um modelo de expansão acelerada e um novo modo de operar.
Da conversão rápida ao título pastoral
Segundo especialistas, uma das principais críticas ao atual cenário é a facilidade com que novos líderes religiosos surgem. Pessoas com histórico recente de conversão, algumas vezes sem formação teológica, assumem o título de pastor e abrem templos em série. O pastor e pesquisador R.C. (nome abreviado a pedido), com mais de 20 anos de atuação no ministério, afirma que há um processo de “banalização do chamado pastoral”.
“Hoje muitos se autointitulam pastores sem preparo, sem estudo e sem avaliação séria de caráter. Têm usado a estrutura da igreja para comercializar

Para ele, o fenômeno mistura marketing, emocionalismo e uma liturgia cada vez mais centrada no espetáculo, e menos no estudo bíblico. Espetáculos no altar e estacionamentos lotados. Nossa equipe acompanhou, no último fim de semana, o culto de uma das igrejas da denominação investigada. O estacionamento estava lotado. A movimentação lembrava grandes eventos, com forte aparato de recepção e música em volume elevado.
Dentro do templo, o culto revelou um cenário incomum a quem busca práticas tradicionais: coreografias teatrais no altar, iluminação colorida e uma pregação curta, sem aprofundamento exegético, que culminou em uma longa sessão dedicada a ofertas. Embora práticas artísticas não sejam incomuns em muitas igrejas contemporâneas, membros da denominação afirmam que o conteúdo bíblico tem sido cada vez mais reduzido.a fé. Paulo já alertava sobre isso, dizendo que alguns ‘mercadejavam a Palavra de Deus’. Infelizmente, vemos isso se repetir.”, afirmou o pesquisador.

Portas fechadas durante a semana
Durante cinco dias seguidos, a reportagem realizou visitas inesperadas a quatro unidades diferentes da mesma denominação. Em todas, encontrou as portas fechadas durante o horário comercial, sem atendimento à comunidade, sem atividades sociais e sem qualquer responsável para esclarecimentos. O contraste com o movimento intenso de domingo é forte: templos lotados no fim de semana, mas praticamente inativos ao longo da semana.
O relato de um membro: “Igreja virou show”
Conversamos, sob anonimato, com J.M., membro há mais de três anos da igreja. O depoimento surpreende pela sinceridade:
“Eu amo a minha igreja, mas tem coisas que me incomodam. A gente vê muitos shows, muita apresentação, mas pouco ensino. E a verdade é que a igreja só funciona domingo. Durante a semana, se você tenta falar com o pastor, não consegue. Só com um auxiliar ou obreiro.”
Segundo ele, a proposta inicial era evangelística e voltada ao bairro, mas “a rotina virou evento” e a comunidade local raramente é atendida.
Entre a fé e o mercado religioso
Sociólogos da religião argumentam que o fenômeno não é isolado. Em várias regiões do país, templos modernos têm adotado estratégias parecidas: cultos-espetáculo, foco em grandes audiências, roteiros inspirados em técnicas de persuasão e uma dependência crescente das contribuições financeiras dos fiéis. Ainda assim, especialistas alertam que não se deve generalizar todas as igrejas evangélicas, muitas trabalham de forma séria, transparente e comprometida com a comunidade.

O desafio: recuperar o propósito
Para líderes tradicionais, o desafio é reconduzir a prática religiosa ao propósito original: ensino, acolhimento e serviço. Para fiéis, o alerta é buscar discernimento e senso crítico, avaliando se o ambiente espiritual reflete, de fato, os valores que afirma defender.
Enquanto isso, o fenômeno observado em Vila Velha, templos que se enchem aos domingos, mas permanecem fechados à comunidade durante a semana, acende luz vermelha para um debate urgente: qual o papel da igreja em uma sociedade que tem confundido fé com espetáculo?
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Rosângela magre - 18/11/2025 09h40
Excelente matéria! É de doer o coração ver a palavra de Deus sendo banalizada. Mas nos acende um alerta ,porque o próprio Jesus disse que isso aconteceria nos últimos dias! Que Deus nos de a cada dia discernimento para entendermos de que lado nós estamos…
Excelente matéria! É de doer o coração ver a palavra de Deus sendo banalizada. Mas nos acende um alerta ,porque o próprio Jesus disse que isso aconteceria nos últimos dias! Que Deus nos de a cada dia discernimento para entendermos de que lado nós estamos…




