Suprema Vergonha Nacional: a música de 2019 que antecipou o autoritarismo do STF


Por Alan Fardin - Opinião ES

A música “STF: Suprema Vergonha Nacional”, lançada em 2019 por Tales Volpi, o MC Reaça, já trazia, à época, um grito de alerta contra os excessos do Supremo Tribunal Federal. Hoje, seis anos depois, seus versos ecoam com ainda mais força, como se MC Reaça tivesse antevisto o futuro sombrio que se tornaria o nosso presente. Na verdade, não se trata de profecia, mas de uma denúncia precoce: o que temos hoje é apenas o desdobramento de uma Corte que já militava politicamente há muito tempo e que agora atua sem qualquer pudor, blindada por sua própria autoridade. Logo nos primeiros versos, o artista dispara:

“O Supremo Tribunal, maior corte do Brasil, virou vergonha nacional da pátria que nos pariu.” Era 2019, mas poderia ser hoje.
Criminosos soltos, opositores perseguidos Em 2020, o STF soltou André do Rap, um dos chefes do PCC, por decisão com base em uma tecnicalidade processual. O criminoso fugiu imediatamente e permanece foragido até hoje. Em 2022, Sérgio Cabral, ex-governador do Rio de Janeiro, com mais de 400 anos de condenações acumuladas por corrupção, teve sua prisão revogada por decisão do STF. Hoje, vive confortavelmente em liberdade, ativo nas redes sociais, reconstruindo sua imagem pública, como se a fortuna desviada dos cofres públicos e o mal causado à população tivessem sido apagados com um simples despacho judicial.

O ex-ministro petista José Dirceu, condenado por corrupção ativa e lavagem de dinheiro, também foi beneficiado por decisões da Corte que lhe garantiram liberdade e, nos bastidores, ele segue politicamente influente até hoje.
Em setembro de 2024, o STF garantiu liberdade a Elvis Riola de Andrade, conhecido como Cantor do PCC, ex-diretor da Gaviões da Fiel, condenado por participação no assassinato de um agente penitenciário e com vínculos notórios com o crime organizado. A decisão foi assinada por Dias Toffoli e acompanhada pela maioria da Segunda Turma. Em dezembro do mesmo ano, o então presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, manteve a liberdade de Riola, mesmo após recursos da PGR e do Ministério Público que apontavam risco à ordem pública.

E em 2025, o padrão se repetiu. O ministro Dias Toffoli anulou todos os processos contra Antônio Palocci, ex-ministro petista condenado a 12 anos de prisão na Lava Jato. A justificativa foi baseada em precedentes que questionavam a atuação do ex-juiz Sérgio Moro. O resultado foi a soltura imediata de Palocci, com efeito retroativo, apesar de ele ter confessado crimes em delação premiada. E qual juiz pode questionar Toffoli e os outros 10 togados? Ninguém!

Antes do 8 de janeiro já havia presos invisíveis

Antes mesmo dos atos de 8 de janeiro de 2023, brasileiros já vinham sendo presos por protestar contra o governo, por participar de manifestações pacíficas ou simplesmente por publicar opiniões nas redes sociais. Muitos deles ainda hoje vivem sob tornozeleiras eletrônicas, restrições judiciais, bloqueio de bens e censura total de comunicação, sem condenação definitiva.
Um dos casos mais emblemáticos é o do vereador Armandinho Fontoura, de Vitória (ES), preso em dezembro de 2022 por publicar críticas ao sistema político e ao Judiciário. Armandinho havia sido eleito presidente da Câmara Municipal, mas foi impedido de tomar posse, ficando um ano preso preventivamente, sem julgamento. Ao final, a própria Polícia Federal vasculhou sua vida e concluiu que ele não cometeu nenhuma ilegalidade. O Ministério Público Federal, inclusive, pediu sua soltura, reconhecendo o excesso da medida.

Ou seja, Armandinho ficou preso simplesmente porque o ministro Alexandre de Moraes não gostou do que ele escreveu. E mesmo que houvesse algo ofensivo, o que não se comprovou, o devido processo legal permitiria apuração e eventual reparação civil, como multa ou retratação, não prisão sumária nem afastamento político.

“Pra você que paga a conta, não pode nem criticar, que vem logo um mandado, eles querem nos calar”, destaca trecho da música.

O próprio ex-presidente Jair Bolsonaro foi alvo de uma medida judicial sem precedentes no mundo democrático: teve suas redes sociais suspensas, foi proibido de conceder entrevistas pela internet e impedido de se comunicar com aliados políticos, tudo isso sem condenação judicial. O conjunto dessas restrições antecipadas, sem trânsito em julgado, fere frontalmente os princípios do contraditório, da ampla defesa e da liberdade política.
Justiça ou militância de toga?

Ministros que deveriam agir com sobriedade e imparcialidade passaram a se comportar como verdadeiros políticos de palanque. Dão entrevistas com ar de campanha, fazem bravatas em eventos ideológicos e agem como militantes togados. Um dos mais evidentes foi protagonizado pelo atual presidente do STF, Luís Roberto Barroso, ao lado de Flávio Dino, num congresso da UNE, uma entidade historicamente alinhada à esquerda. Diante de uma plateia militante, Barroso bradou: “Nós derrotamos o bolsonarismo”. A frase escancarou o partidarismo. O escândalo? Nenhum. Nem uma advertência institucional. A naturalização desse comportamento revela a falência dos freios e contrapesos: nosso Congresso é hoje um figurante decorativo diante da supremacia da toga.

Esses ministros atacam adversários ideológicos com adjetivos típicos de acusadores, não de um juiz constitucional. Usam expressões como “milicianos digitais”“organizações criminosas antidemocráticas” e “extrema-direita golpista” antes mesmo de qualquer sentença. Julgam com base em conceitos vagos como “narrativas antidemocráticas” e, cada vez mais, revogam decisões legítimas do Congresso Nacional, desprezando a vontade soberana do eleitor.

Diante da votação do IOF, escancarou o mecanismo. O Congresso, cumprindo seu papel, derrubou o novo imposto criado por Lula. Mas o STF, acionado por partidos aliados, restaurou o tributo por meio de uma canetada judicial, como se o voto dos congressistas valesse menos do que a vontade de um ministro “simpatizante” da causa governista.
E quando o alvo é um adversário político incômodo, o método é ainda mais direto: basta escolher o inimigo, associá-lo a termos como “fake news”“ódio” ou “ameaça à democracia”, e a máquina judicial se move com rapidez implacável. Foi assim com ex-deputado Fernando Francischini, cassado por expressar opinião em uma live. E Daniel Silveira teve sua liberdade cerceada e foi banido da vida pública.

Toffoli, Gilmar e Moraes foram citados na música
Sobre Dias Toffoli:

“Nunca passou em concurso, reprovado na OAB, defensor de vagabundo, advogado do PT.”

Essa crítica remete ao histórico de Toffoli, que antes de ser nomeado ministro do STF, atuou como advogado do PT e foi advogado-geral da União no governo Lula. A menção à reprovação na OAB foi frequentemente usada para deslegitimar sua competência jurídica.

Sobre Gilmar Mendes:

“Lá em cima tem um outro exemplo de tirania, a PF prende os caras e ele solta no outro dia.”
Essa linha denuncia, em tom sarcástico, a percepção de que Gilmar Mendes age como um facilitador de impunidade, soltando presos acusados de corrupção ou outros crimes, contrariando a Polícia Federal e o Ministério Público.
Sobre Alexandre de Moraes:

“E o secretário tucano advogou pro PCC, virou ministro do Supremo, coisa triste de se ver.”
Essa parte faz referência ao passado de Moraes como secretário de Segurança Pública no governo de Geraldo Alckmin (PSDB), e atual vice de Lula, e às acusações de que seu escritório teria prestado serviços jurídicos ao Primeiro Comando da Capital (PCC). A crítica associa isso a um suposto aparelhamento do STF com figuras ligadas a interesses escusos.
Não faltam falas públicas de ministros que reforçam a partidarização do Judiciário
Cármen Lúcia, durante o julgamento do Marco Civil da Internet (2025):

”É preciso impedir que 213 milhões de pequenos tiranos soberanos dominem os espaços digitais no Brasil.”
➥ A declaração foi feita em referência direta à população brasileira, tratando os cidadãos como potenciais opressores que devem ser contidos pelo Estado. A ministra falava sobre a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, dispositivo que impedia a remoção arbitrária de conteúdos nas redes sociais. Sua fala simboliza uma visão autoritária segundo a qual a liberdade do povo é uma ameaça, e cabe ao Judiciário censurar preventivamente para proteger a “ordem”, uma ordem definida por poucos, fora do voto.

Nesse cenário, o Judiciário age em sintonia com grandes emissoras, como a Globo, cuja hegemonia sobre a narrativa pública vem sendo corroída pelas redes sociais, onde cada cidadão se tornou um emissor de informação e opinião. Diante disso, a proposta de regulamentação da internet surge como um instrumento para limitar essa liberdade de expressão, justamente porque se sabe que a direita é maioria nas redes. O objetivo é claro: reduzir seu alcance, sufocar sua capacidade de mobilização e impedir que temas incômodos ao STF e ao governo ganhem luz. A velha desculpa de que “a internet não pode ser terra sem lei” é repetida à exaustão, mas não se sustenta.

O ordenamento jurídico brasileiro já oferece mecanismos legais eficazes: quem se sentir ofendido pode acionar a Justiça, que tem poder de intimar diretamente o autor da postagem a removê-la sob pena de multa, muitas vezes elevadíssima. Além disso, a Justiça pode determinar que a própria plataforma exclua o conteúdo e, em casos de comprovado dano, conceder indenização à vítima. Ou seja, o sistema já funciona quando é provocado dentro do devido processo legal. O que está em jogo agora não é a ausência de regras, mas o avanço da censura prévia, com decisões judiciais que punem antes do contraditório e eliminam conteúdos e perfis por critérios políticos, não jurídicos.

Gilmar Mendes, em entrevista à GloboNews (2021):

“A extrema-direita brasileira é bárbara, incivilizada e inimiga da Constituição.”
➥ Trata-se de uma fala que generaliza, rotula e desumaniza os opositores ideológicos do ministro, classificando-os não como cidadãos críticos ou politicamente divergentes, mas como inimigos da ordem constitucional. O uso da expressão “extrema-direita” não vem para isolar um segmento específico, mas para transformar toda a direita em alvo simbólico de hostilidade, associando-a automaticamente a barbarismo, incivilidade e ameaça institucional.
Esse tipo de discurso, vindo de um magistrado da mais alta corte, abre caminho para que qualquer repressão policial, judicial ou administrativa contra conservadores seja interpretada como legítima e até necessária. Ao desumanizar o adversário político, reduzindo-o a uma entidade inimiga e sem valores, cria-se uma narrativa em que censura, perseguição e prisão são somente instrumentos de defesa da “democracia”.

Afinal, o que se faz com um inimigo bárbaro? Ataca-se. Neutraliza-se. Elimina-se. Mendes não apenas ataca ideias, ele carimba seres humanos com um selo de ilegitimidade, como se suas existências públicas pudessem ser moralmente apagadas sem ferir os princípios republicanos. Um ministro da Suprema Corte, que deveria garantir o pluralismo, alimenta a intolerância institucionalizada.

Dias Toffoli, em seminário no México (2023):

“A Justiça brasileira [diga-se o STF] foi o que impediu a ruptura institucional desejada por uma minoria radical.”
➥ Um autoelogio travestido de defesa da democracia, no qual o ministro reivindica para o Supremo o protagonismo absoluto na contenção de uma suposta ameaça institucional. Ao usar o termo “minoria radical”, Toffoli repete a narrativa que rotula toda a oposição conservadora como extremista, mesmo quando formada por cidadãos pacíficos e ordeiros.

Essa “minoria”, constantemente chamada de extrema-direita pela própria Corte, passou a ser tratada como categoria criminosa, embora suas manifestações, em quase na totalidade, tenham sido marcadas por orações, famílias com crianças e bandeiras do Brasil. Fora o episódio de 8 de janeiro, onde houve depredação e ações violentas cometidas por uma pequena fração dos presentes [inclusive com atuações de infiltrados da esquerda], não há histórico significativo de violência em manifestações conservadoras no Brasil. Ainda assim, essa narrativa de minoria perigosa foi usada como base para prisões em massa, censura preventiva e o silenciamento de vozes dissonantes, como se qualquer crítica fosse um ataque ao Estado de Direito. Na prática, Toffoli naturalizou a perseguição judicial à direita, sob a roupagem de estabilidade institucional.
Edson Fachin, em conferência da USP (2022):

“As forças do atraso estão se armando para sabotar a democracia.”
➥ Um discurso alarmista, com forte carga ideológica, no qual o ministro não apenas critica opositores, mas sugere que há uma estrutura hostil e beligerante em curso. A expressão “estão se armando” carrega conotação militar, insinuando preparação bélica ou subversiva, o que, no campo jurídico, favorece a criminalização preventiva e a prisão de cidadãos com base em meras suposições.

Em vez de provas materiais, construíram-se narrativas onde opiniões viraram ameaças, e insinuações passaram a justificar ações penais. Foi exatamente sob esse tipo de retórica que se fundamentaram prisões cautelares longas, bloqueios de comunicação e censura de redes sociais, mesmo sem condenações ou evidências concretas. Trata-se da institucionalização da conjectura como evidência.

Cristiano Zanin, ministro do STF (2024), ao votar pela suspensão da rede social X (antigo Twitter) no Brasil:

“O descumprimento reiterado de decisões do STF é extremamente grave para qualquer cidadão ou entidade, pública ou privada. Ninguém pode atuar no Brasil sem obedecer às leis e à Constituição.”

➥ A frase parece neutra, mas carrega um recado implícito e ameaçador. O problema é quando não há canais legítimos para contestar essas decisões, especialmente quando o próprio Supremo julga, censura, condena e ainda revisa os próprios atos. A quem recorrer quando o juiz também é o acusador e o executor? No contexto da perseguição aos conservadores, essa postura cria um caminho sem saída: o cidadão é acusado por expressar uma opinião contrária ao pensamento dominante, tem o julgamento acelerado, e ao tentar recorrer, enfrenta os mesmos ministros militantes que já o condenaram moral e politicamente desde o início. O resultado?

Cadeia, censura e isolamento social. Não por crime cometido, mas por pensamento divergente. Quando Zanin afirma que “ninguém pode atuar no Brasil sem obedecer às leis e à Constituição”, o subtexto, na prática, é outro: não critique o STF nem confronte a esquerda, ou enfrentará uma versão distorcida da lei, moldada pelo regimento interno da Corte, onde ministros legislam, julgam e punem com seletividade. Essa é a essência de uma censura preventiva, na qual a suposta “gravidade institucional” vira pretexto para eliminar da esfera pública qualquer voz conservadora, seja ela um ex-presidente, um padre, um jornalista ou um cidadão comum.

E é aí que entra a precisão desconcertante da música de MC Reaça, que já denunciava esse cenário com clareza:

“A nossa Constituição eles têm que obedecer, mas tão se achando semi-deuses, ditadores do poder.”
Sua morte causou comoção. E a perseguição implacável da mídia expôs, com nitidez, o movimento do sistema
Tales foi encontrado morto pouco tempo depois de lançar a música. A causa oficial determinada pelas autoridades foi suicídio.
Antes de morrer, Volpi foi intensamente atacado pela grande mídia, que tentou rotulá-lo como criminoso, enquanto suas denúncias, hoje confirmadas pelos fatos, alertavam para o avanço da censura e da repressão seletiva contra a direita no Brasil. O que chamavam de exagero virou norma institucional. Assim como acontece atualmente, a velha imprensa destrói reputações e o STF completa o ciclo com cassações e prisões. Primeiro, tornam o alvo um ser abjeto; depois, o eliminam da vida pública sob o pretexto de proteger a democracia.

Ouça a música completa e entenda por que ela continua tão atual quanto incômodo.


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